Thursday, November 24, 2005

veja bem.

- E aí, como foi a cirurgia? Tá enxergando bem?
- Estou. Esse é o problema. Enxergo tudo bem demais. Demais. Ah, não sei, sinto falta de deitar de noite, tirar os óculos, e pegar no sono naquela visão embaçada deliciosa. Ou então quando sentia a mínima dor de cabeça, tirava os óculos e parecia que a dor até desanimava de encher o saco. Agora não tenho pra onde fugir da dor de cabeça, demoro para dormir, já que fico preocupado com aquelas rachaduras no teto, e não sei porque, enxergando bem assim, parece que estou ouvindo melhor também, ou seja ouço coisas demais também, como a vizinha gritando com o cachorro, minha mulher fazendo barulho estranho com o estômago, os gatos da minha rua nunca treparam tão alto. Acho que ganhei o combo todo: visão mais audição. Queria ter de volta aquela falsa, mas importante idéia de fragilidade que os óculos imprimiam em meu caráter. Estou vendo demais, e não quero ver tanto assim. Quero ser míope de novo.
- Caramba.
- Mas não doeu nada. Impressionante.

Thursday, October 27, 2005

all five horizons















Dia 3 de dezembro. Finalmente. Pearl Jam. A importância desse show pode parecer pequena aos mais desavisados. Mas era facilmente entendida nos rostos tensos, até incrédulos das pessoas na fila dos ingressos, contrastando com a alegria dos mesmos na saída do guichê. Poucas bandas têm uma comunhão tão grande com seus admiradores. E eles são muitos. Dia 3 de dezembro. Pearl Jam. Finalmente.

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Dia 01 de novembro. Férias. Finalmente. Fiquem em paz.

Monday, October 17, 2005

vida.

Nada acontecia. Dentro do quarto de hospital, na madrugada úmida, nas ruas que a janela invariavelmente mostrava, a vida seguia seu curso, feliz para uns, tortuoso para outros. As luzes da cidade a distraiam. Deitado, seu marido demonstrava uma tranqüilidade ensurdecedora, há quase um ano. Desde então, nada acontecia. Aparentemente. Por dentro, sentia que morria lentamente, toda vez que olhava para aquela cama esperando um movimento qualquer. Naquela noite, os olhos se abriram três vezes. Seu sorriso eufórico foi interrompido por um estrondo, vindo da rua. Um acidente, improvável, mas agora consumado. Médicos foram chamados. “Ele piscou. Sim, por favor, venham logo. Ele piscou três vezes!” Voltou-se para a janela. Motoristas discutiam na rua molhada o culpado pela colisão. Não pareciam feridos. Sentiu-se bem. As luzes da madrugada então ficaram mais fracas em seus olhos brilhantes. A vida era boa, afinal.

Tuesday, August 09, 2005

paz exterior.

Seu refúgio não ficava em nenhuma praia, cabana nas montanhas ou quarto escuro. Sempre que precisava ficar só, refletir, chorar ou simplesmente não pensar em nada, ia para o centro da cidade. Na mesma rua, sua rua, estreita e de poucos pedestres, estacionava seu carro, fechava os vidros, e enquanto ouvia música, esquecia de tudo que o atormentava, ou levava tudo ali para dentro, e de lá sempre saía com novos sonhos, decisões mirabolantes e soluções adiadas. “Quando ninguém te nota, a cidade fica muda”, costumava pensar toda vez que desligava o motor para entrar em uma nova fuga.

Até que, numa tarde fria de um domingo sonolento, a cidade não se calou. Na verdade, nunca falara tão alto. Agitado, tentava, como de costume, escutar aquele silêncio que tanto lhe fazia bem, mas até os raros coletivos dominicais vinham gritar-lhe aos ouvidos.

Não pode ser. Fora descoberto. Do edifício em frente, uma moça na sacada o observava preguiçosamente, mas muito interessada. O que ela quer, indagou-se, enquanto disfarçava o constrangimento de ser alvo e o incômodo de lembrar que não estava sozinho na cidade. Ligou o carro e saiu, confuso. Um misto de sentimentos tomou conta da situação. A raiva inicial deu lugar a uma risada incontrolável. Quando ninguém te nota, gritava. Quando ninguém te nota...

Thursday, July 07, 2005

O frio e a arte de admirar quem muda.

Da janela o relógio mostra 10°C. Está tão frio que quando estalo meu dedão esquerdo, puxo a pele do cotovelo junto. Sabe como é? Bom, era isso que tinha pra falar do frio.

Hoje ouvi numa música a seguinte frase: “the more you change, the less you fake”. Para quem não tem tecla SAP no computador, quer dizer que quanto mais você muda, menos finge. E fiquei com isso na cabeça, mas sem formar nenhuma opinião. Pois bem, aqui está: eu concordo com a frase, aliás acho que é uma das coisas mais legais que li ultimamente. Tenho essa estranha mania de me irritar com tudo que se mostra igual. As pessoas têm milhares de súbitos desejos de mudança, todos os dias, mas insistem em podar todos eles, seja por medo, ou o que é pior, por preguiça. Por isso, quem atende aos chamados desses insistentes desejos, está sendo muito honesto, principalmente com ela mesma. Admiro quem abandona um livro na metade, apenas por não gostar do que leu até ali. O inglês que decidiu não tomar o metrô hoje, e ir andando até o trabalho, está muito feliz com sua mudança. Alguém que nunca muda de opinião, corte de cabelo, seu xampu, de casamento infeliz, vai invariavelmente fingir que teve e tem a vida que pediu a Deus. Pedido apenas atendido em seus raros sonhos.

Wednesday, April 20, 2005

no sofá. *

- Sabe uma coisa que adoro?
- Não.
- Ficar desenhando com a ponta do dedo. Assim, no vazio, sabe?
- Sei, mas no vazio mesmo?
- Eu prefiro quando tem um céu azul, com muitas nuvens. Fica mais fácil imaginar cada desenho.
- E o que você mais desenha?
- Ah, isso não importa tanto, já que quando acabo alguma figura, ela nem está mais lá.
- É, faz sentido.
- Desse jeito, nunca ficam feios. Os desenhos. Não ficam expostos, ninguém julga, ninguém critica. Acho melhor assim.
- Sei, realmente, as pessoas se metem muito no desenho dos outros. Mas quase nunca desenham nada.
- Eu desenho.


* para Luciana

Tuesday, April 19, 2005

idioteque.



Who's in a bunker? Who's in a bunker? Women and children first. And the children first. And the children. I'll laugh until my head comes off. I'll swallow 'till I burst. Until I burst. Until I

Who's in a bunker? Who's in a bunker? I have seen too much. I haven't seen enough. You haven't seen it. I'll laugh until my head comes off. Women and children first. And children first. And children

Here I'm allowed. Everything all of the time. Here I'm allowed. Everything all of the time

Ice age coming. Ice age coming. Let me hear both sides. Let me hear both sides. Let me hear both. Ice age coming. Ice age coming. Throw it in the fire. Throw it in the fire. Throw it on the

We're not scaremongering. This is really happening. Happening. We're not scaremongering. This is really happening. Happening. Mobiles squirking. Mobiles chirping. Take the money run. Take the money run. Take the money

Here I'm allowed. Everything all of the time. Here I'm allowed. Everything all of the time. Here I'm allowed. Everything all of the time. Here I'm allowed. Everything all of the time

The First of the children. The First of the children. The First of the children.